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19 de Abril de 2024
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    Processo Civil

    Publicado por Carta Forense
    há 16 anos

    Tendo recentemente participado de ciclo de palestras promovido pelo Egrégio Tribunal Regional Federal da Terceira (3ª) Região, dedicado ao exame e debate acerca de diferentes questões relacionadas à ação rescisória, fui ali indagado acerca do cabimento da ação rescisória contra decisões proferidas no âmbito dos Juizados Especiais Federais. Desde então, sem embargo do arremedo de resposta positiva dado na oportunidade à assistência e, em particular, à ilustre e culta Magistrada que me dirigiu a indagação, tenho refletido sobre o tema e tomo a liberdade de compartilhar essas reflexões com os leitores deste conceituado periódico.

    É sabido que, no sistema da Lei 9099 /95, há expressa vedação constante do art. 59 , taxativo ao estatuir que "Não se admitirá ação rescisória nas causas sujeitas ao procedimento instituído por esta lei". As disposições do citado Diploma, como igualmente sabido, aplicam-se aos Juizados Especiais Federais, no que não conflitarem com as disposições da Lei 10259 /01. Essa última, em relação àquela outra, guarda relação de especialidade. Daí porque, não havendo previsão expressa dessa segunda que contrarie a regra geral, a resposta que se poderia dar à indagação que intitula este trabalho deveria ser negativa.

    Contudo, como acima mencionado, já na ocasião em que, tomado de surpresa, fui indagado, propendia à resposta positiva. Agora, essa solução ainda mais se afigura correta para mim.

    Primeiro, convém reafirmar posição que precedentemente sustentei inclusive em âmbito doutrinário: se lei ordinária exclui o cabimento da ação rescisória em determinada situação, disposição legal dessa ordem não se afigura, só por isso, inconstitucional. Não obstante a ação rescisória certamente tenha respaldo na garantia da ação (CF , art. , inciso XXXV), e embora reconhecendo que a Constituição preveja a ação rescisória dentre as causas de competência originária dos tribunais, isso não parece suficiente para impedir que o Legislador ordinário considere as hipóteses nas quais é conveniente sobrepor à garantia da ação os valores da estabilidade e da segurança, que estão à base da coisa julgada material. Ademais, não há que se cogitar de inconstitucionalidade uma vez que a lei não obsta o julgamento do mérito, mas impede um novo julgamento do mérito, que teria lugar se cabível e se procedente a ação rescisória.

    Por isso, sustentamos que, vedada a ação rescisória, nenhuma outra via processual - com nome ou rótulo diverso, mas com idênticos fundamentos e pedido - pode lhe fazer as vezes. Nem mesmo é de se admitir o mandado de segurança que, nesse particular, não escapa ao contexto da garantia da ação que, reitere-se, cede diante do trânsito em julgado e da legítima opção legislativa. A solução é, sem dúvida dura, mas é aquela que sempre nos pareceu a mais adequada, diante do eterno dilema que se põe ao Legislador processual, que busca a edição de soluções justas, de um lado, e de soluções estáveis, de outro.

    Não será demasiado lembrar que restrições ao cabimento da ação rescisória não são exclusividade do sistema dos Juizados Especiais. No âmbito do controle abstrato e concentrado de constitucionalidade há vedação expressa e na seara do processo eleitoral o instituto é consideravelmente limitado.

    Em contrapartida, também dissemos no passado, e agora reafirmamos, que a edição de sentença eivada de algum dos vícios do art. 485 do CPC , quando não autorizada a ação rescisória (e então pensávamos especificamente na restrição da Lei 9099 /95), há que abrir as portas para a eventual responsabilização civil do Estado (ou de outrem), a depender das circunstâncias do caso, da natureza do vício e de suas repercussões, patrimoniais ou morais. Além disso, mesmo quando a ação rescisória seja expressamente excluída pelo ordenamento, não se pode descartar o eventual cabimento de ação declaratória de inexistência, se a sentença padecer de vício dessa natureza que, como cediço, dispensa a propositura de ação rescisória, na medida em que o que é juridicamente inexistente não comporta desconstituição. A inexistência - em suas relativamente escassas hipóteses - é objeto de mera declaração (que, por seu turno, não se confunde com a chamada ação anulatória prevista pelo art. 486 do CPC).

    Mas, a razão fundamental que leva à crença de que a ação rescisória não deve ser excluída do sistema dos Juizados Especiais Federais reside na constatação de que a vedação ao cabimento daquele remédio é disposição que, se não diverge de regra explícita da citada Lei 10259 /01, conflita com sua essência e razão de ser. Com efeito, ao ser editada, a Lei 9099 /95, dentre outras, assentava-se na idéia de que ficavam excluídas da competência dos Juizados Civis as causas de natureza fiscal e "de interesse da Fazenda Pública" (art. 3º, parágrafo 2º). Naquele contexto, fazia sentido que, suposto ser inevitável o conflito, a opção por decisões céleres prevalecesse, em última análise, sobre a opção por decisões justas.

    Contudo, aos Juizados Federais compete precisamente processar, conciliar e julgar causas de competência da Justiça Federal até o valor de sessenta salários mínimos, bem como executar as suas sentenças; competência que, substancialmente, é ditada pela presença dos interesses - diretos ou indiretos - da União em juízo. Assim, ainda que o rol das exclusões constantes do parágrafo 1º do art. da Lei 10259 /01 sejam consideravelmente amplas, os Juizados Federais foram criados para exercer uma competência que, em substância, abarca à Fazenda Pública. As decisões ali proferidas destinam-se a produzir efeitos na órbita de pessoas jurídicas de direito público ou, quando menos, que envolvem interesse público.

    Sendo assim, não faz sentido e não pode prevalecer a exclusão da ação rescisória porque, constatados vícios da gravidade daqueles arrolados pelo art. 485 do CPC , vícios esses que comprometam ou que possam comprometer o interesse público (não apenas o dito secundário, mas também, ainda que indiretamente, o interesse público primário), a opção pela celeridade há que ceder espaço à busca, certo que limitada, por decisões justas. Essa solução nos parece mais adequada e preferível àquela consistente em, não havendo possibilidade de se propor ação rescisória, admitir-se, a pretexto da defesa do interesse público, eventual desconsideração da coisa julgada fora dos domínios da ação rescisória - que, não custa lembrar, tem hipóteses definidas, está sujeita a prazo decadencial determinado e se concretiza mediante o emprego de regras processuais bem claras e definidas, que limitam o exercício do poder estatal.

    Naturalmente, cabível que seja a ação rescisória nos âmbitos dos Juizados, ela continua a se caracterizar por ser excepcional. E, naturalmente, não é porque o interesse público é sua justificativa que, eventualmente, ela não possa caber também em favor do adversário da Fazenda Pública.

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