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19 de Abril de 2024
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    Processo Penal II

    Publicado por Carta Forense
    há 16 anos

    Conceito e Inadmissibilidade

    São inadmissíveis, no processo, as provas obtidas por meios ilícitos - CF , art. , inc. LVI . Nesse dispositivo constitucional reside o princípio da inadmissibilidade das provas ilícitas que, finalmente, foram devidamente disciplinadas pela legislação ordinária (por força da Lei 11.690 /2008).

    Provas ilícitas, em virtude da nova redação dada ao art. 157 do CPP pela Lei 11.690 /2008, são "as obtidas em violação a normas constitucionais ou legais". Em outras palavras: prova ilícita é a que viola regra de direito material, constitucional ou legal, no momento de sua obtenção (confissão mediante tortura, v.g.). Essa obtenção, de qualquer modo, sempre se dá fora do processo (é, portanto, sempre extraprocessual).

    O art. 32 da Constituição portuguesa bem exemplifica o que se entende por prova ilícita: "São nulas todas as provas obtidas mediante tortura, coação, ofensa da integridade física ou moral da pessoa, abusiva intromissão na vida privada, no domicílio, na correspondência ou nas telecomunicações".

    Como se vê, o tema das provas ilícitas tem total afinidade com o dos direitos fundamentais da pessoa. Todas as regras que disciplinam a obtenção das provas são, evidentemente, voltadas para os órgãos persecutórios do Estado, que não podem conquistar nenhuma prova violando as limitações constitucionais e legais existentes. Descobrir a verdade dos fatos ocorridos é função do Estado, mas isso não pode ser feito a qualquer custo.

    Prova ilegítima é a que viola regra de direito processual no momento de sua obtenção em juízo (ou seja: no momento em que é produzida no processo). Exemplo: oitiva de pessoas que não podem depor, como é o caso do advogado que não pode nada informar sobre o que soube no exercício da sua profissão (art. 207 , do CPP). Outro exemplo: interrogatório sem a presença de advogado; colheita de um depoimento sem advogado etc. A prova ilegíma, como se vê, é sempre intraprocessual (ou endoprocessual).

    O fato de uma prova violar uma regra de direito processual, portanto, nem sempre conduz ao reconhecimento de uma prova ilegítima. Por exemplo: busca e apreensão domiciliar determinada por autoridade policial (isso está vedado pela CF , art. , X , que nesse caso exige ordem judicial assim como pelo CPP - art. 240 e ss.). Como se trata de uma prova obtida fora do processo, cuida-se de prova ilícita, ainda que viole concomitantemente duas regras: uma material (constitucional) e outra processual.

    Conclusão: o que é decisivo para se descobrir se uma prova é ilícita ou ilegítima é o locus da sua obtenção: dentro ou fora do processo. De qualquer maneira, combinando-se o que diz a CF , art. , inc. LVI ("São inadmissíveis, no processo, as provas obtidas por meios ilícitos) com o que ficou assentado no novo art. 157 do CPP (" ilícitas são as provas obtidas em violação a normas constitucionais ou legais "), se vê que umas e outras (ilícitas ou ilegítimas) passaram a ter um mesmo e único regramento jurídico: são inadmissíveis (cf . PACHECO, Denílson Feitoza, Direito processual penal, 3. ed., Rio de Janeiro: Impetus, 2005, p. 812).

    Dizia-se que a CF , no art. , LVI , somente seria aplicável às provas ilícitas ou ilícitas e ilegítimas ao mesmo tempo, ou seja, não se aplicaria para as provas (exclusivamente) ilegítimas. Para esta última valeria o sistema da nulidade, enquanto para as primeiras vigoraria o sistema da inadmissibilidade. Ambas as provas (ilícitas ou ilegítimas), em princípio, não valem (há exceções, como veremos), mas os sistemas seriam distintos.

    Essa doutrina já não pode ser acolhida (diante da nova regulamentação legal do assunto). Quando o art. 157 (do CPP) fala em violação a normas constitucionais ou legais, não distingue se a norma legal é material ou processual. Qualquer violação ao devido processo legal, em síntese, conduz à ilicitude da prova (cf . Mendes, Gilmar Ferreira et alii, Curso de Direito constitucional, São Paulo: Saraiva: 2007, p. 604-605, que sublinham:" A obtenção de provas sem a observância das garantias previstas na ordem constitucional ou em contrariedade ao disposto em normas fundamentais de procedimento configurará afronta ao princípio do devido processo legal ").

    Paralelamente às normas constitucionais e legais existem também as normas internacionais (previstas em tratados de direitos humanos). Por exemplo: Convenção Americana sobre Direitos Humanos. No seu art. 8º ela cuida de uma série (enorme) de garantias. Provas colhidas com violação dessas garantias são provas que colidem com o devido processo legal. Logo, são obtidas de forma ilícita. Uma das garantias previstas no art. 8º diz respeito à necessidade de o réu se comunicar livre e reservadamente com seu advogado. Caso essa garantia não seja observada no momento da obtenção da prova (depoimento de uma testemunha, v.g.), não há dúvida que se trata de uma prova ilícita (porque violadora de uma garantia processual prevista na citada Convenção).

    Não importa, como se vê, se a norma violada é constitucional ou internacional ou legal, se material ou processual: caso venha a prova a ser obtida em violação a qualquer uma dessas normas, não há como deixar de concluir pela sua ilicitude (que conduz, automaticamente, ao sistema da inadmissibilidade).

    Sistema da Inadmissibilidade das Provas Ilícitas

    Do princípio da verdade real (ou seja: verdade processual) deriva o princípio da liberdade de provas, que não é (de forma alguma) absoluta. As partes contam com liberdade para a obtenção, apresentação e produção da prova, mas essa liberdade tem limites. Nem tudo que pode ser útil para a descoberta da verdade está amparado pelo direito vigente. O direito não deve ser realizado a qualquer preço. Por isso mesmo o que vale então no processo penal é a verdade processual, que significa a verdade que pode ser (jurídica e validamente) comprovada e a que fica (efetivamente) demonstrada nos autos.

    Em outras palavras, o direito à prova conta com várias limitações. Não é um direito ilimitado. Com efeito, (a) a prova deve ser pertinente (perícia impertinente: CPP , art. 184 ; perguntas impertinentes: CPP , art. 212 ; Lei 9.099 /95, art. 81 , § 1º); (b) a prova deve ser lícita; (c) devem ser observadas várias restrições legais: art. 207 (direito ao sigilo), 479 (proibição de leitura de documentos ou escritos não juntados com três dias de antecedência) etc.; (d) e ainda não se pode esquecer que temos também no nosso ordenamento jurídico várias vedações legais (cartas interceptadas criminosamente: art. 233 do CPP ) e constitucionais (provas ilícitas, v.g.). De outro lado, provas cruéis, desumanas ou torturantes, porque inconstitucionais, também não valem.

    Dentre todas as limitações nessa matéria (obtenção de provas), destacam-se, evidentemente, as provas ilícitas. Em relação a elas rege o sistema da inadmissibilidade, como veremos em seguida.

    Os dois clássicos sistemas sobre a prova ilícita (ou seja: obtida por meio ilícito) são: (a) o da admissibilidade (male captum, bene retentum) e (b) o da inadmissibilidade. Até meados da década de 70 vigorava o primeiro no Brasil; a partir daí passou a prosperar na jurisprudência do STF sobretudo o segundo, que acabou sendo acolhido pela CF de 1988 (art. 5º, inc. LVI).

    Inadmissibilidade significa que a prova ilícita não pode ser juntada aos autos. E se juntada? É ineficaz e deve ser desentranhada. O direito à prova encontra correspondência com o direito à exclusão da prova: cf . RTJ 163, p. 682 e ss; RTJ 163, p. 709 e ss. E se a sentença nela se baseou? É nula.

    Por força do sistema da inadmissibilidade a prova ilícita ou ilegítima, portanto, deve ser excluída desde logo dos autos do processo (CPP , art. 157).

    Pelo sistema da admissibilidade a prova não é retirada do processo, sendo certo que no final o juiz declara sua nulidade (derivando disso responsabilidade penal ou penal e civil a quem usou a prova ilícita). O sistema da inadmissibilidade não permite que a prova permaneça no processo: ela deve ser prontamente excluída. Exclusão a priori ou imediata (sistema da inadmissibilidade) e declaração da nulidade a posteriori (sistema da admissibilidade): nisso reside a diferença entre os dois sistemas.

    Conjugando-se a CF (art. 5º, inciso LVI) com o Código de Processo Penal (novo art. 157 , com redação dada pela Lei 11.690 /2008) não há dúvida que o primeiro (sistema da inadmissibilidade da prova ilícita) é o que vigora (com exclusividade) no direito brasileiro vigente. O segundo (sistema da admissibilidade da prova ilícita e sua conseqüente declaração de nulidade) já não encontra nele nenhum espaço.

    De tudo quanto foi dito extrai-se que o princípio básico relacionado com as provas é o seguinte: é admissível a prova sempre que nenhuma norma a exclua (CORDERO, Franco, citado por LOPES JR., Aury, Direito processual e sua conformidade constitucional, v. 1, Rio de Janeiro: Lumen Juris, 207, p. 561).

    Fazia falta no direito pátrio a norma contida, agora, no art. 157 do CPP , que expressamente manda desentranhar (excluir) dos autos a prova ilícita. Já não cabe nenhuma dúvida: toda prova ilícita ou ilegítima (que afronta o devido processo legal) deve ser desentranhada dos autos do processo, ou seja, essa prova não pode servir de base para o convencimento do juiz.

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    Disponível em: https://www.jusbrasil.com.br/noticias/processo-penal-ii/87928

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